Ministério
do Equipamento Social e do Ambiente
Decreto-Lei n.º 511/75
de 20 de Setembro
1. A inexistência
de planeamento quer a nível nacional, quer a nível regional, de
um adequado ordenamento do território, com vista ao desenvolvimento harmónico
e coordenado de várias regiões, e a circunstância de os
promotores terem tido, praticamente, a possibilidade de comandarem, em larga
medida, a gestão urbanística, orientando a expansão da
urbanização para as áreas que lhes proporcionavam maiores
lucros, permitiram a concessão de licenças de loteamentos em localizações
e condições manifestamente prejudiciais para o desenvolvimento
equilibrado das zonas em que se integram e, numa perspectiva mais ampla, para
o harmónico desenvolvimento do território.
Desse facto resultaram já inconvenientes muito graves para a colectividade,
como, por simples exemplos, as carências e insuficiências que essas
inadequadas localizações projectam nos sistemas viários
e de transportes públicos e nos vários equipamentos sociais indispensáveis.
Muitas das localizações desses loteamentos afectam gravemente
a potencialidade produtiva do País em alimentos frescos na proximidade
dos maiores centros consumidores e comprometem a possibilidade de implantação
de espaços verdes de manutenção viável que permitam,
ainda, a solução dos problemas bio-físicos próprios
das áreas urbanizadas.
Por outro lado, a construção em terrenos de aptidão agrícola
excepcional exige, muitas vezes, fundações de custo muito elevado
que comprometem o possível objectivo social do empreendimento.
A execução de loteamentos já licenciados ou em vias de
licenciamento poderá agravar intensamente tais inconvenientes, avolumando
as assimetrias já existentes no desenvolvimento regional e impondo, no
futuro, investimentos públicos e outros custos sociais muito elevados,
para a correcção ou até a simples atenuação
dos prejuízos e dificuldades que tais loteamentos determinam.
Daí, a manifesta conveniência de dotar a Administração
de instrumentos legais que permitam evitar a consolidação e o
desenvolvimento de situações tão prejudiciais para a colectividade,
obstando à execução dos loteamentos que se mostrem nocivos,
embora já licenciados.
2. Não existindo impossibilidade de ordem constitucional, tem-se por
legítimo actuar naquele sentido.
Pensa-se, contudo, que as providências a adoptar devem ter a maleabilidade
suficiente para permitir atender à diversidade de condicionalismos existentes.
Difere-se para ulterior diploma a solução dos problemas relativos
às indemnizações que sejam de atribuir pela extinção
ou modificação dos direitos resultantes das licenças concedidas.
E isto porque tal questão tem de ser ponderada com cautela, de modo a
limitar as indemnizações aos prejuízos ou danos que se
considere socialmente justo ressarcir.
Nestas condições, julgou-se preferível relegar a matéria
das questões relativas àquelas indemnizações para
a altura em que venham a apreciar-se os problemas ligados às indemnizações
devidas pelas expropriações, de forma a aproveitar o resultado
da discussão destas outras questões, apesar dos seus diferentes
ou específicos condionalismos.
3. A eventual incidência, das providências previstas no presente
diploma, na não realização de obras já projectadas
e até na suspensão de obras de urbanização já
em curso, como na subtracção de certos terrenos à edificação
de construções, torna ainda mais premente, face à actual
conjutura económica e às volumosas carências habitacionais,
a necessidade de com a maior urgência se conseguir a disponibilidade efectiva
de terrenos para construção, de molde, até, a poderem ser
oferecidas alternativas aos promotores atingidos pelas medidas.
Aqueles eventuais efeitos aconselham, por isso, um uso equilibrado das providências
adoptadas, dentro da ideia de uma correcta apreciação relativa
dos prejuízos que o seu emprego poderá, simultaneamente, causar
e evitar.
Mas afigura-se claro que essa avaliação deve ser feita numa perspectiva
voltada ao futuro, sem atender exclusivamente, pois, à situação
presente.
É que a actual contemporização com certas situações
anómalas, embora evitando alguns efeitos inconvenientes, decorrentes
do uso das providências adoptadas, poderá acarretar no futuro -
e até a curto prazo - prejuízos e custos sociais, de vária
ordem, bastante mais elevados do que os correspondentes aos que o emprego das
providências poderá agora ocasionar.
Nestes termos:
Usando da faculadade conferida pelo artigo 3.º, n.º 1, alínea
3), da Lei Constitucional n.º 6/75, de 26 de Março, o Governo decreta
e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. Poderá ser declarada a suspensão da validade das licenças de loteamento concedidas anteriormente à data do início da vigência do presente diploma ou dentro dos noventa dias seguintes a essa mesma data, quando haja justificado receio:
a) De o loteamento, ainda que conforme com plano de urbanização aprovado, ser prejudicial para o desenvolvimento ordenado da zona, para o harmónico ordenamento do território, para o equilíbrio ecológico da região ou por abranger solos de excepcional aptidão agrícola (solos das classes de capacidade de uso A, B, A/B e subclasse CH, classificação do Serviço de Reconhecimento e Ordenamento Agrário);
b) De o respectivo projecto apresentar graves deficiências de estrutura ou de natureza da ocupação nele prevista.
2. A suspensão pode
ter por objecto licenças de loteamento ou abranger todas as que respeitem
a prédios situados em certa área.
3. A suspensão das licenças de loteamento não abrange os
lotes nos quais já tenha sido iniciada a construção de
edifícios, devidamente licenciada.
Artigo 2.º A suspensão da validade das licenças de loteamento será declarada por despacho do Secretário de Estado da Habitação e Urbanismo, oficiosamente ou mediante proposta dos órgãos de administração municipal competentes para a sua concessão ou de qualquer entidade que tenha sido ouvida no processo ou à qual esteja confiada a prossecução dos interesses que fundamentem a proposta de suspensão.
Artigo 3.º - 1. Por
despacho do Secretário de Estado da Habitação e Urbanismo,
poderá ser suspenso o recebimento de pedidos de licença de loteamento,
para áreas em relação às quais, ainda que abrangidas
por planos de urbanização, haja justificado receio de a concessão
de novas licenças poder causar prejuízos para o desenvolvimento
ordenado da zona ou para o harmónico ordenamento do território.
2. As suspensões declaradas ao abrigo do número anterior têm
também como efeitos, para as áreas a que se apliquem:
a) A suspensão de recebimento de pedidos de informação sobre a possibilidade de realização de operações de loteamento;
b) A suspensão dos processos de pedido dessas informações ou de concessão de licenças de loteamento.
3. As suspensões previstas neste artigo podem ser declaradas oficiosamente ou mediante proposta dos órgãos de administração municipal competentes para o licenciamento ou de qualquer entidade à qual esteja confiada a prossecução dos interesses que fundamentem a proposta.
Artigo 4.º - 1. As
suspensões declaradas ao abrigo dos artigos 1.º e 3.º cessarão
nas datas que forem sendo fixadas por despacho do Secretário de Estado
da Habitação e Urbanismo, à medida que forem sendo definidos
os critérios necessários para as decisões a tomar sobre
os loteamentos, com vista à defesa dos interesses públicos que
justificaram a suspensão.
2. As suspensões poderão cessar por deliberação
do órgão de administração municipal competente para
a concessão das licenças, quando assim se estabeleça no
despacho que tenha declarado a suspensão.
Artigo 5.º - 1. O
termo da suspensão da validade das licenças de loteamento não
implica a renovação automática das mesmas, conferindo apenas
aos respectivos titulares a faculdade de pedirem a revisão das licenças
concedidas; poderá proceder-se oficiosamente, porém, à
revisão das licenças de loteamentos que sejam considerados de
interesse público.
2. Na revisão das licenças poderá ser decidida a sua confirmação,
com ou sem alterações, ou o respectivo cancelamento.
3. Se a licença for confirmada sem alteração quanto a prazos
fixados, consideram-se estes prorrogados por período correspondente ao
decorrido entre a suspensão da licença e a sua confirmação.
4. Consideram-se caducas as licenças cujos titulares não requeiram
a respectiva revisão dentro dos quarenta e cinco dias seguintes ao último
acto de publicidade do termo da suspensão, salvo nos casos de revisão
oficiosa, ao abrigo da última parte do n.º 1.
5. Serão regulamentados por despacho do Secretário de Estado da
Habitação e Urbanismo as regras e prazos a observar nos processos
de revisão das licenças.
Artigo 6.º - 1. O
termo da suspensão a que se refere o artigo 3.º não determina
a movimentação oficiosa dos processos de pedido de licença
de loteamento ou de informação sobre a possibilidade de operações
dessa natureza, conferindo apenas aos interessados a faculdade de requererem
o respectivo prosseguimento; poderá ordenar-se oficiosamente o prosseguimento
do processo, porém, quando se considere o loteamento de interesse público.
2. Considera-se haver desistência do pedido se os interessados não
solicitarem o prosseguimento do processo dentro dos quarenta e cinco dias seguintes
ao último acto de publicidade do termo da suspensão, salvo nos
casos de prosseguimento oficioso do processo, ao abrigo da última parte
do número anterior.
3. Se o processo prosseguir, começará a correr novo prazo para
a fase ou diligência processual em que o mesmo se encontrava à
data da suspensão, contando-se tal prazo a partir do recebimento, pela
entidade competente para essa fase, da comunicação do prosseguimento
do processo.
4. No caso previsto no número anterior, o prazo para a formação
de acto tácito será acrescido de período correspondente
ao prazo a que se refere o mesmo número.
Artigo 7.º - 1. Os
órgãos de administração municipal competentes para
a concessão de licenças de loteamento poderão deliberar
que todos ou alguns dos processos que, à data do início da vigência
do presente diploma, não tenham ainda decisão final, voltem a
iniciar os respectivos termos ou sejam objecto de nova apreciação
por quaisquer das entidades que tenham já dado parecer, autorização
ou aprovação.
2. As medidas previstas no número anterior poderão ser determinadas,
por despacho do Secretário de Estado da Habitação e Urbanismo,
para todos os processos de licenças de loteamento relativos a prédios
situados em certas áreas.
3. Nos casos contemplados na última parte do n.º 1, o prazo para
a formação de acto tácito será acrescido dos prazos
respeitantes à emissão de novos pareceres, autorizações
ou aprovações.
Artigo 8.º - 1. Às
suspensões declaradas ao abrigo do disposto nos artigos 1.º e 3.º
e às decisões sobre o respectivo termo, bem como às previstas
no n.º 2 do artigo anterior, será dada publicidade no Diário
do Governo e pelos meios a que se refere o n.º
3 do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 289/73, de 6 de Junho.
2. As suspensões produzem efeitos a partir da data em que primeiramente
tiver lugar qualquer dos meios de publicidade mencionados no número anterior.
3. O reinício dos processos de licenciamento e a solicitação
de novos pareceres, autorizações ou aprovações,
nos termos do n.º 1 do artigo antecedente, serão notificados aos
requerentes.
Artigo 9.º A suspensão da validade das licenças de loteamento dá direito ao levantamento da caução prestada segundo o artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 289/73, sem prejuízo da prestação de nova caução, se a licença for confirmada.
Artigo 10.º A suspensão da validade das licenças de loteamento é equiparada à falta de licença no que respeita a actos posteriores à suspensão, designadamente para os efeitos do disposto na parte final do n.º 3 do artigo 24.º e nos artigos 27.º e 30.º a 32.º do Decreto-Lei n.º 289/73.
Artigo 11.º - 1. Será
definida, em decreto a publicar no prazo de cento e oitenta dias, a eventual
indemnização pela prática de actos autorizados pelo presente
decreto-lei em atenção aos prejuízos que se considere socialmente
justo ressarcir.
2. Até ao início da vigência do diploma previsto no número
anterior, não será admitida a propositura de acções
em que se peça indemnização pela prática de actos
autorizados pelo presente decreto-lei ou a declaração de responsabilidade
do Estado ou de outros entes públicos pelos mesmos actos.
Artigo 12.º O Secretário de Estado da Habitação e Urbanismo poderá delegar a competência que lhe é atribuída no presente diploma nos órgãos que considerar mais adequados para o seu exercício.
Artigo 13.º Este diploma entra imediatamente em vigor.
Visto e aprovado em Conselho
de Ministros. - Vasco dos Santos Gonçalves - Álvaro Cunhal - Joaquim
Jorge Magalhães Mota - Francisco José Cruz Pereira de Moura -
António Carlos Magalhães Arnão Metelo - José Augusto
Fernandes.
Promulgado em 12 de Setembro de 1975.
Publique-se.
O Presidente da República, FRANCISCO DA COSTA GOMES.