Ministérios
da Marinha e das Obras Públicas
Decreto-Lei n.º 468/71
de 5 de Novembro
Terceira alteração dada
pela Lei n.º 16/2003 de 4 de Junho (revê,
actualiza e unifica o regime jurídico dos terrenos do domínio
público hídrico).
1. Com o presente diploma
pretende o Governo rever, actualizar e unificar o regime jurídico dos
terrenos incluídos no que se convencionou chamar o domínio público
hídrico.
Impunha-se, com efeito, proceder a tal revisão, pois o direito aplicável
a uma matéria tão vasta e complexa como esta encontrava-se muito
antiquado e muito disperso, não satisfazendo por isso as necessidades
actuais.
Muito antiquado: na verdade, grande parte das disposições até
agora vigentes datavam de 1892, ano em que foi publicado o Regulamento dos Serviços
Hidráulicos, que regulou o assunto segundo as concepções
da época, e vários outros preceitos agora substituídos,
embora mais recentes, vinham já dos regulamentos marítimos de
1919 ou das reformas de 1926.
E muito disperso: realmente, o regime aplicável aos terrenos do domínio
público hídrico constituía, nos últimos tempos,
uma autêntica manta de retalhos, daí advindo todas as indesejáveis
consequências que se verificam em circunstâncias semelhantes e,
nomeadamente, a perturbação da certeza do direito e a incoerência
das soluções adoptadas nos diferentes diplomas e nas várias
épocas.
2. Refere-se o presente diploma ao domínio público hídrico
do continente e das ilhas adjacentes, mas não visa regular o regime das
águas públicas que o compõem, antes pretende estabelecer
apenas o regime dos terrenos públicos conexos com tais águas,
ou sejam, na terminologia adoptada, os leitos, as margens e as zonas adjacentes.
Houve a preocupação de definir, com o possível rigor, esses
conceitos, de traçar, com maior precisão, a extensão territorial
das três realidades que se reportam e, enfim, de fixar por forma expressa
o estatuto jurídico dos terrenos incluídos em cada uma dessas
categorias.
Quanto aos leitos e às margens, foram acolhidas as noções
tradicionais, embora se tenha aproveitado a ocasião para resolver alguns
problemas suscitados perante fórmulas menos explícitas, para eliminar
certas lacunas de regulamentação em pontos relativamente importantes
e, ainda, para aumentar de 5 m para 10 m, por motivos imperiosos de interesse
púbico e também para defesa dos proprietários confinantes,
a largura da margem das águas não navegáveis nem flutuáveis.
Mas o que mais importa sublinhar é a fixação em 50 m da
largura da margem das águas do mar e das águas navegáveis
ou flutuáveis sujeitas à jurisdição das autoridades
marítimas ou portuárias. Resolveu-se, assim, eliminar as dúvidas
de interpretação que as disposições até agora
vigentes consentiam, acolhendo a solução que melhor salvaguarda
os interesses do Estado e que corresponde, aliás, ao entendimento que
sempre tem sido sustentado pela nossa administração dominial.
Quanto às zonas adjacentes, trata-se de uma figura nova, caracterizada
pela sujeição a determinadas restrições de utilidade
pública dos terrenos situados para além das margens, mas em posição
tal que tenham de ser considerados como terrenos ameaçados pelo mar ou
como terrenos ameaçados pelas cheias (dos rios). Pensa-se que, assim,
pelo contrôle das edificações a erguer em tais zonas, confiado
aos serviços hidráulicos, tècnicamente apetrechados para
o efeito, será possível actuar de modo mais eficaz na prevenção
de graves acidentes como os que têm vitimado, por motivo do avanço
das águas do mar ou de cheias extraordinárias dos rios, os habitantes
de zonas ameaçadas que aí construíram as suas casas sem
que o Estado pudesse legalmente intervir para os defender contra a sua própria
imprevidência.
3. Os preceitos que definem o estatuto público ou privado dos terrenos
que integram os leitos, margens e zonas adjacentes das águas públicas
não alteram, no essencial, o regime vigente. Mas entendeu-se que havia
vantagem em adoptar critérios explícitos que permitam resolver
as questões suscitadas pelo recuo e pelo avanço das águas.
Já quanto ao reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de
leitos ou margens públicos se tocou num aspecto mais relevante, que,
sem envolver modificação profunda do direito vigente, beneficia
contudo num ponto importante, aliás com inteira justiça, os proprietários
particulares: quando se mostre terem ficado destruídos por causas naturais
os documentos anteriores a 1864 ou a 1868 existentes em arquivos ou registos
públicos, presumir-se-ão particulares os terrenos em relação
aos quais se prove que, antes de 1 de Dezembro de 1892, eram objecto de propriedade
ou posse privadas. Aliviando deste modo o peso do ónus da prova imposto
aos interessados, vai-se ao encontro da opinião que se tem generalizado
no seio da Comissão do Domínio Público Marítimo,
dada a grande dificuldade, em certos casos, de encontrar documentos que inequìvocamente
fundamentem as pretensões formuladas à administração
dominial.
Não pode, no entanto, esquecer-se que esta orientação,
baseada em princípios gerais firmemente assentes na nossa ordem jurídica
- o princípio da não retroactividade das leis e o princípio
do respeito dos direitos adquiridos -, não deverá prejudicar,
na prática, os interesses gerais da colectividade, em razão dos
quais, precisamente, se foi criando e se mantém na titularidade do Estado
o domínio público hídrico. É por isso que se institui,
pela primeira vez em termos genéricos, um conjunto de providências
tendentes a permitir ao Estado fazer ingressar no seu domínio público
as parcelas privadas dos leitos ou margens públicos.
Também se dispõe, por forma mais completa e mais clara, acerca
das operações de delimitação e do julgamento das
questões de propriedade ou posse.
4. No que diz respeito à matéria das servidões administrativas
a que estão sujeitos os leitos e as margens, ou suas parcelas, quando
sejam objecto da propriedade privada, o presente diploma limita-se a reafirmar
ou, quando muito, a alargar determinações já contidas noutros
preceitos que se não afigurou oportuno revogar ou desmembrar. Ainda assim,
sempre se esclareceram vários pontos duvidosos e se preencheram algumas
lacunas, sobretudo em matéria de expropriações.
Quanto às restrições de utilidade pública impostas
aos proprietários confinantes com as margens das águas do mar
ou dos rios, importa salientar a já mencionada inovação
das zonas adjacentes.
O respectivo regime consiste fundamentalmente em assegurar, aí, a intervenção
dos serviços hidráulicos no planeamento urbanístico ou
no licenciamento da edificação, de modo que possam ser tomados
em conta os perigos emergentes da proximidade das águas e da probabilidade
da sua acção devastadora. Este regime só é aplicável,
todavia, nas zonas que sejam classificadas como ameaçadas pelo mar ou
pelas cheias por decreto do Ministro das Obras Públicas, depois de ouvidas,
conforme os casos, as demais entidades interessadas, designadamente o Ministério
da Marinha e a Secretaria de Estado da Informação e Turismo.
5. A última parte do presente diploma compendia e sistematiza os traços
essenciais do regime jurídico dos usos privativos do domínio público,
de acordo com os princípios, com a nossa tradição legislativa
e com as necessidades do momento, e à luz das mais recentes concepções
formuladas no direito comparado, na doutrina e na jurisprudência.
Revestem-se de especial importância os preceitos que estabelecem em novos
moldes a distinção entre licenças e concessões de
uso privativo, o elenco dos poderes e deveres dos respectivos titulares, os
termos em que são possíveis as utilizações provisórias,
o regime das taxas aplicáveis, as regras sobre transmissões e
hipotecas, os sistemas de cessação do uso privativo e os meios
de defesa da Administração e dos utentes privativos contra ocupações
abusivas e outras atitudes ilícitas.
Não deve, contudo, deixar de salientar-se em especial, de entre todos
estes aspectos, aquele que se afigura mais relevante e de maior alcance - a
substituição de um regime de estabilidade ao regime puramente
precário em que os particulares efectuavam, até aqui, os seus
investimentos em iniciativas de utilidade pública nos terrenos do domínio
público hídrico.
Se realmente certo uso privativo é requerido para um fim de utilidade
pública - aproveitamento de águas públicas para abastecimento
de povoações, ou edificação de um hotel com interesse
para o turismo, por exemplo -, não faz sentido, nem é justo, submetê-lo
ao regime da licença precária, revogável a todo o tempo
e sem que o interessado tenha direito a qualquer indemnização,
como vinha sucedendo até hoje.
Determinou-se, portanto, que se adoptará antes o regime da concessão
- o que acarreta, nomeadamente, em caso de rescisão, o dever de indemnizar
o custo das obras e das instalações fixas que ainda não
possa estar amortizado - sempre que se trate de usos privativos que exijam a
realização de investimentos em instalações indesmontáveis
e sejam considerados de utilidade pública.
Crê-se poder, com isto, instaurar uma nova fase na exploração
das riquezas contidas no domínio hídrico nacional, atraindo mais
intensamente os capitais e impondo critérios mais justos nas suas relações
com o Estado.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo
109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para
valer como lei, o seguinte:
I
Princípios gerais
ARTIGO 1.º
(Âmbito de aplicação)
Os leitos das águas do mar, correntes de água, lagos e lagoas, bem como as respectivas margens e zonas adjacentes, ficam sujeitos ao preceituado no presente diploma em tudo quanto não seja regulado por leis especiais ou convenções internacionais.
ARTIGO 2.º
(Noção de leito; seus limites)
1.
Entende-se por leito o terreno coberto pelas águas, quando não
influenciadas por cheias extraordinárias, inundações ou
tempestades. No leito compreendem-se os mouchões, lodeiros e areais nele
formados por deposição aluvial.
2. O leito das águas do mar, bem como das demais águas sujeitas
à influência das marés, é limitado pela linha da
máxima preia-mar de águas vivas equinociais. Essa linha é
definida, para cada local, em função do espraiamento das vagas
em condições médias de agitação do mar, no
primeiro caso, e em condições de cheias médias, no segundo.
3. O leito das restantes águas é limitado pela linha que corresponder
à estrema dos terrenos que as águas cobrem em condições
de cheias médias, sem transbordar para o solo natural, habitualmente
enxuto. Essa linha é definida, conforme os casos, pela aresta ou crista
superior do taludo marginal ou pelo alinhamento da aresta ou crista do taludo
molhado das motas, cômoros, valados, tapadas ou muros marginais.
ARTIGO
3.º
(Noção de margem; sua largura)
1. Entende-se por margem
uma faixa de terreno contígua ou sobranceira à linha que limita
o leito das águas.
2. A margem das águas do mar, bem como a das águas navegáveis
ou flutuáveis sujeitas à jurisdição das autoridades
marítimas ou portuárias, tem a largura de 50 m.
3. A margem das restantes águas navegáveis ou flutuáveis
tem a largura de 30 m.
4. A margem das águas não navegáveis nem flutuáveis,
nomeadamente torrentes, barrancos e córregos de caudal descontínuo,
tem a largura de 10 m.
5. Quando tiver natureza de praia em extensão superior à estabelecida
nos números anteriores, a margem estende-se até onde o terreno
apresentar tal natureza.
6. A largura da margem conta-se a partir da linha limite do leito. Se, porém,
esta linha atingir arribas alcantiladas, a largura da margem será contada
a partir da crista do alcantil.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO
4.º
(Noção de zona adjacente; sua largura)
1. Entende-se por zona
adjacente toda a área contígua à margem que como tal seja
classificada por decreto, por se encontrar ameaçada pelo mar ou pelas
cheias.
2. As zonas adjacentes estendem-se deste o limite da margem até uma linha
convencional definida, para cada caso, no decreto de classificação,
nos termos e para os efeitos do presente diploma.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO
5.º
(Condição jurídica dos leitos, margens e zonas adjacentes)
1. Consideram-se do domínio
público do Estado os leitos e margens das águas do mar e de quaisquer
águas navegáveis ou flutuáveis, sempre que tais leitos
e margens lhe pertençam, e bem assim os leitos e margens das águas
não navegáveis nem flutuáveis que atravessem terrenos públicos
do Estado.
2. Consideram-se objecto de propriedade privada, sujeitos a servidões
administrativas, os leitos e margens das águas não navegáveis
nem flutuáveis que atravessem terrenos particulares, bem como as parcelas
dos leitos e margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis
ou flutuáveis que forem objecto de desafectação ou reconhecidas
como privadas nos termos deste diploma.
3. Consideram-se objecto de propriedade privada, sujeitas a restrições
de utilidade pública, as zonas adjacentes.
4. Consideram-se objecto de propriedade privada, nos arquipélagos da
Madeira e dos Açores, os terrenos tradicionalmente ocupados junto à
crista das arribas alcantiladas das respectivas ilhas.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 6.º
(Recuo das águas)
Os leitos dominiais que
forem abandonados pelas águas, ou lhes forem conquistados, não
acrescem às parcelas privadas da margem que porventura lhes sejam contíguas,
continuando integrados no domínio público, se não excederem
as larguras fixadas no artigo 3.º, e entrando automàticamente no
domínio privado do Estado, no caso contrário.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 7.º
(Avanço das águas)
1. Quando haja parcelas
privadas contíguas a leitos dominiais, as porções de terreno
corroídas lenta e sucessivamente pelas águas consideram-se automàticamente
integradas no domínio público, sem que por isso haja lugar a qualquer
indemnização.
2. Se as parcelas privadas contíguas a leitos dominiais forem invadidas
pelas águas que nelas permaneçam sem que haja corrosão
dos terrenos, os respectivos proprietários conservam o seu direito de
propriedade, mas o Estado pode expropriar essas parcelas.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 8.º
(Reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de leitos ou margens públicos)
1. As pessoas que pretendam
obter o reconhecimento da sua propriedade sobre parcelas de leitos ou margens
das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis
devem provar documentalmente que tais terrenos eram, por título legítimo,
objecto de propriedade particular ou comum antes de 31 de Dezembro de 1864 ou,
se se tratar de arribas alcantiladas, antes de 22 de Março de 1868
2. Na falta de documentos susceptíveis de comprovar a propriedade dos
terrenos nos termos do n.º 1 deste artigo, presumir-se-ão particulares,
sem prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação
aos quais se prove que, naquelas datas, estavam na posse em nome próprio
de particulares ou na fruição conjunta de indivíduos compreendidos
em certa circunscrição administrativa.
3. Quando se mostre que os documentos anteriores a 1864 ou a 1868, conforme
os casos, se tornaram ilegíveis ou foram destruídos por incêndio
ou facto semelhante ocorrido na conservatória ou registo competente,
presumir-se-ão particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros,
os terrenos em relação aos quais se prove que, antes de 1 de Dezembro
de 1892, eram objecto de propriedade ou posse privadas.
4. Não ficam sujeitos ao regime de prova estabelecido nos números
anteriores os terrenos que, nos termos da lei, hajam sido objecto de um acto
de desafectação.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 9.º
(Constituição da propriedade pública sobre parcelas privadas
de leitos ou margens públicos)
1. Em caso de alienação,
voluntária ou forçada, por acto entre vivos, de quaisquer parcelas
privadas de leitos ou margens públicos, o Estado goza do direito de preferência,
nos termos dos artigos 416.º a 418.º e 1410.º do Código
Civil, podendo a preferência exercer-se, sendo caso disso, apenas sobre
a fracção do prédio que, nos termos dos artigos 2.º
e 3.º deste diploma, se integre no leito ou na margem.
2. O Estado pode proceder, nos termos da lei geral, a expropriação
por utilidade pública de quaisquer parcelas privadas de leitos ou margens
públicos sempre que isso se mostre necessário para submeter ao
regime da dominialidade pública todas as parcelas privadas existentes
em certa zona.
3. Os terrenos adquiridos pelo Estado de harmonia com o disposto neste artigo
ficam automàticamente integrados no seu domínio público.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 10.º
(Delimitações)
1. A delimitação
dos leitos e margens dominiais confinantes com terrenos de outra natureza compete
ao Estado, que a ela procederá oficiosamente, quando necessário,
ou a requerimento dos interessados.
2. Das comissões de delimitação farão sempre parte
representantes dos proprietários dos terrenos confinantes com os leitos
ou margens dominiais a delimitar.
3. Sempre que às comissões de delimitação se depararem
questões de índole jurídica que elas não estejam
em condições de decidir por si, poderão os respectivos
presidentes requerer a colaboração ou solicitar o parecer do delegado
do procurador da República da comarca onde se situem os terrenos a delimitar.
4. A delimitação, uma vez homologada pelos Ministros da Justiça
e da Marinha, será publicada no Diário do Governo.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 11.º
(Questões de propriedade ou posse)
1. A delimitação
a que se proceder por via administrativa não preclude a competência
dos tribunais comuns para decidir da propriedade ou posse dos leitos e margens,
ou suas parcelas.
2. Se, porém, o interessado pretender seguir o acto de delimitação
de quaisquer vícios próprios desta que se não traduzam
numa questão de propriedade ou posse, deve interpor o respectivo recurso
contencioso de anulação.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
II
Servidões administrativas e restrições de utilidade pública
ARTIGO 12.º
(Servidões sobre parcelas privadas de leitos e margens públicos)
1. Todas as parcelas privadas
de leitos ou margens públicos estão sujeitas às servidões
estabelecidas por lei e, nomeadamente, a uma servidão de uso público
no interesse geral do acesso às águas e da passagem ao longo das
águas, da pesca, da navegação ou flutuação,
quando se trate de águas navegáveis ou flutuáveis, e ainda
da fiscalização e polícia das águas pelas autoridades
competentes.
2. Nas parcelas privadas de leitos ou margens públicos, bem como no respectivo
subsolo e no espaço aéreo correspondente, não é
permitida a execução de quaisquer obras, permanentes ou temporárias,
sem licença do Ministério das Obras Públicas, pela Direcção-Geral
dos Serviços Hidráulicos.
3. Os proprietários de parcelas privadas de leitos ou margens públicos
estão sujeitos a todas as obrigações que a lei estabelece
no que respeita à execução de obras hidráulicas,
nomeadamente de correcção, regularização, conservação,
desobstrução e limpeza.
4. Se da execução pelo Estado de qualquer das obras referidas
no n.º 3 deste artigo resultarem prejuízos que excedam os encargos
resultantes das obrigações legais dos proprietários, o
Estado indemnizá-los-á. Se se tornar necessária, para a
execução dessas obras, qualquer porção de terreno
particular, ainda que situada para além das margens, o Estado poderá
expropriá-la.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO
13.º
(Zonas ameaçadas pelo mar)
1. Sempre que se preveja
tècnicamente o avanço das águas do mar sobre terrenos particulares
situados para além da margem, pode o Estado classificar a área
em causa como zona ameaçada pelo mar.
2. A classificação de uma área como zona ameaçada
pelo mar será feita por decreto emanado do Ministério das Obras
Públicas, ouvido o Ministério da Marinha e, tratando-se de zonas
com interesse turístico, a Secretaria de Estado da Informação
e Turismo.
3. Uma vez classificada certa área como zona ameaçada pelo mar,
os terrenos nela abrangidos ficam sujeitos ao regime estabelecido no artigo
15.º.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 14.º
(Zonas ameaçadas pelas cheias)
1. O Estado pode classificar
como zona ameaçada pelas cheias a área contígua à
margem de um rio que se estenda até à linha alcançada pela
maior cheia que se produza no período de um século.
2. A classificação de uma área como zona ameaçada
pelas cheias será feita por decreto emanado do Ministério das
Obras Públicas, ouvido o Ministério da Marinha, nas áreas
sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas.
3. Uma vez classificada certa área como zona ameaçada pelas cheias,
os terrenos nela abrangidos ficam sujeitos ao regime estabelecido no artigo
15.º.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 15.º
(Regime das zonas adjacentes)
1. A aprovação
de planos e anteplanos de urbanização e expansão, bem como
a celebração de contratos de urbanização, relativos
a áreas abrangidas, no todo ou em parte, numa zona adjacente, depende
de parecer da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos.
2. O licenciamento municipal de quaisquer operações de loteamento
urbano relativas às áreas referidas no n.º 1 deste artigo
depende de parecer favorável da Direcção-Geral dos Serviços
Hidráulicos, cabendo ao Ministro das Obras Públicas o poder de
decidir no caso de a câmara municipal competente não se conformar
com aquele parecer.
3. Nas zonas adjacentes em que não haja planos ou anteplanos de urbanização
e expansão, nem contratos de urbanização, nem planos de
loteamento urbano, a realização de quaisquer obras ou edificações
só pode ter início mediante licença da Direcção-Geral
dos Serviços Hidráulicos e desde que se executem as obras hidráulicas
que ela eventualmente imponha.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 16.º
(Disposições complementares)
1. Quando o Estado efectuar
expropriações nos termos deste diploma ou pagar indemnizações
aos proprietários prejudicados por obras hidráulicas de qualquer
natureza, o auto de expropriação ou indemnização
será enviado à repartição de finanças competente,
para que se proceda, se for caso disso, à correcção do
valor matricial do prédio afectado.
2. A competência conferida ao Ministério das Obras Públicas
no tocante às obras de correcção, regularização,
conservação, desobstrução e limpeza de leitos e
margens é transferível para as câmaras municipais ou para
as administrações portuárias e pode ser exercida por aquele
ou por estas em colaboração com quaisquer entidades, públicas
ou privadas, nas condições técnicas e financeiras que forem
definidas pelo Governo.
III
Usos privativos
ARTIGO 17.º
(Permissão de usos privativos)
Com o consentimento das
entidades competentes, podem parcelas determinadas dos terrenos públicos
referidos neste diploma ser destinadas a usos privativos.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 18.º
(Licenças e concessões)
1. O direito de uso privativo
de qualquer parcela dominial só pode ser atribuído mediante licença
ou concessão.
2. Serão objecto de contrato administrativo de concessão os usos
privativos que exijam a realização de investimentos em instalações
fixas e indesmontáveis e sejam consideradas de utilidade pública;
serão objecto de licença, outorgada a título precário,
todos os restantes usos privativos.
3. Não se consideram precárias as licenças conferidas para
a construção ou para obras em terrenos ou prédios particulares
situados na área de jurisdição das autoridades marítimas,
hidráulicas ou portuárias.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 19.º
(Usos de utilidade pública)
São de utilidade pública, além dos que como tal forem declarados pelo Conselho de Ministros, os usos privativos realizados para algum dos seguintes fins:
a) Aproveitamento de águas públicas por pessoas colectivas de direito público ou de utilidade pública administrativa e por empresas de interesse colectivo;
b) Instalação de serviços de apoio à navegação marítima ou fluvial;
c) Instalação de postos para venda de combustíveis ou de estações de serviço para apoio à circulação rodoviária;
d) Aproveitamento de salinas, sapais e terrenos semelhantes para explorações agrícolas, salineiras ou outras actividades económicas análogas;
e) Edificação de estabelecimentos hoteleiros ou similares declarados de interesse para o turismo e de conjuntos turísticos como tais qualificados nos termos da legislação aplicável.
(Ver nova redacção dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 20.º
(Prazos)
As licenças e concessões
podem ser outorgadas pelos prazos máximos de, respectivamente, cinco
e trinta anos.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 21.º
(Conteúdo do direito de uso privativo)
1. As licenças e
concessões de uso privativo, enquanto se mantiverem, conferem aos seus
titulares o direito de utilização exclusiva, para os fins e com
os limites consignados no respectivo título constitutivo, das parcelas
dominiais a que respeitam.
2. Se a utilização permitida envolver a realização
de obras ou alterações, o direito do uso privativo abrange poderes
de construção, transformação ou extracção,
conforme os casos, entendendo-se que tanto as construções efectuadas
como as instalações desmontáveis se mantêm na propriedade
do titular da licença ou da concessão até expirar o respectivo
prazo. Uma vez expirado o prazo, aplica-se o disposto no artigo 26.º
3. Cabe à autoridade administrativa competente entregar ao titular do
direito de uso privativo o terreno dominial, facultando-lhe o início
da utilização consentida.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 22.º
(Realização de obras)
1. Sempre que o uso privativo
implique a realização do obras pelo interessado, cabe a este submeter
o respectivo projecto à aprovação da entidade competente,
devendo executar as obras dentro dos prazos que lhe forem fixados e de harmonia
com o projecto aprovado e com as leis e regulamentos em vigor.
2. A execução das obras fica sujeita à fiscalização
das entidades competentes, cujos agentes terão livre acesso ao local
dos trabalhos.
3. Terminadas as obras deve o interessado remover todo o entulho e materiais
daquelas provenientes para local onde não causem prejuízos de
qualquer espécie.
4. Sem prejuízo da aplicação das outras sanções
que no caso couberem, a inobservância das disposições deste
artigo será punida com a multa estipulada no contrato ou dará
lugar, se forem realizadas obras sem projecto aprovado ou com desrespeito do
projecto aprovado, à sua demolição compulsiva, total ou
parcial, por conta do contraventor.
5. Cabe ao interessado a responsabilidade por todos os prejuízos que
causar com a execução das obras.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 23.º
(Uso dos bens e sua fiscalização)
1. Os terrenos dominiais
que tenham sido objecto de licença ou concessão de uso privativo,
e bem assim as obras neles executadas, não podem, sem autorização
da entidade competente, ser utilizados para fim diferente do que expressamente
estiver fixado no título constitutivo.
2. Nas concessões, o respectivo titular tem o dever de proceder à
utilização intensiva dos terrenos concedidos e das obras executadas,
sem o que a autoridade competente pode aplicar-lhe as multas estipuladas no
contrato ou, se for caso disso, rescindir a concessão.
3. Os titulares de licenças e concessões de uso privativo estão
sujeitos à fiscalização que as entidades com jurisdição
no local entendam dever realizar para vigiar a utilização dada
aos bens dominiais e para velar pelo cumprimento das normas aplicáveis
e das cláusulas estipuladas.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 24.º
(Taxas)
1. Pelo uso privativo de
terrenos dominiais é devida uma taxa, a pagar anualmente, salvo estipulação
em contrário, calculada de harmonia com as tarifas aprovadas ou, na falta
delas, conforme o que em cada caso for fixado pela entidade competente.
2. Quando o direito de uso privativo for atribuído a uma pessoa colectiva
de direito público ou a um particular para fins de beneficência
ou semelhantes, pode ser concedida a isenção do pagamento da taxa
ou a redução desta.
3. Sempre que forem consentidos, a título provisório, usos privativos
em terrenos a respeito dos quais esteja em curso um processo de delimitação,
as taxas devidas não são imediatamente exigíveis, mas o
interessado deve caucionar logo de início o pagamento das respectivas
importâncias.
4. Reconhecida a dominialidade de tais terrenos, torna-se exigível, após
a publicação do respectivo acto de delimitação,
o pagamento das quantias devidas por todo o período de utilização
já decorrido. Se não for reconhecida a dominialidade, nada é
devido, podendo o interessado proceder ao levantamento da caução.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 25.º
(Transmissão das licenças e concessões; hipoteca)
1. Aqueles a quem for consentido
o uso privativo de terrenos dominiais não podem, sem autorização
da entidade que conferiu a licença ou a concessão, transmitir
para outrem os direitos conferidos, nem por qualquer forma fazer-se substituir
no seu exercício.
2. O disposto no número anterior é aplicável à transmissão
de propriedade das obras efectuadas e das instalações montadas
pelo titular da licença ou concessão em terrenos dominiais.
3. Nos casos de sucessão legítima ou legitimária, as licenças
e as concessões transmitem-se aos herdeiros, mas a entidade competente
pode revogá-las ou rescindi-las se isso lhe convier.
4. As obras e os edifícios construídos em terrenos dominiais não
podem ser hipotecados sem autorização da entidade competente.
5. A violação do disposto nos n.os 1, 2 e 4 deste artigo importa
a nulidade do acto de transmissão, substituição ou constituição
de hipoteca, sem prejuízo das outras sanções que no caso
couberem.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 26.º
(Decurso do prazo)
1. Decorrido o prazo da
licença ou concessão de uso privativo, as instalações
desmontáveis deverão ser removidas do local pelo respectivo proprietário,
no prazo que lhe for marcado.
2. Em caso de concessão, as obras executadas e as instalações
fixas revertem gratuitamente para o Estado; em caso de licença, devem
ser demolidas pelo respectivo titular, salvo se o Estado optar pela reversão
ou prorrogar a licença.
3. A entidade competente pode consentir ao titular da concessão a continuação
da exploração nos termos que em novo contrato forem estipulados,
mediante o arrendamento dos bens que hajam revertido para o Estado.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 27.º
(Não cumprimento das obrigações do utente)
1. A entidade competente
pode revogar as licenças a rescindir as concessões de uso privativo,
ouvido o interessado, sempre que a este seja imputável o não cumprimento
das cláusulas estipuladas no título constitutivo ou das obrigações
legais e regulamentos aplicáveis.
2. Quando o não cumprimento não for exclusivamente imputável
ao utente privativo, a entidade competente deve, conforme os casos, prorrogar
os prazos excedidos ou diminuir ou excluir as multas aplicáveis.
3. Em caso de revogação ou de rescisão determinadas como
sanção, é aplicável o disposto nos n.os 1 e 2 do
artigo 26.º.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 28.º
(Extinção de uso privativo por conveniência de interesse
público)
1. A entidade competente
pode extinguir em qualquer momento, por acto fundamentado, os direitos de uso
privativo constituídos mediante licença ou concessão, se
os terrenos dominiais forem necessários à utilização
pelo público sob a forma de uso comum ou se outro motivo de interesse
público assim o exigir.
2. A revogação das licenças não confere ao interessado
direito a qualquer indemnização.
3. A rescisão das concessões confere ao interessado direito a
uma indemnização equivalente ao custo das obras realizadas e das
instalações fixas que ainda não possa estar amortizado,
calculada em função do tempo que faltar para terminar o prazo
da concessão. A indemnização não poderá,
porém, exceder o valor das obras e instalações fixas no
momento da rescisão.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 29.º
(Redução de área)
1. Quando a área
afectada ao uso privativo for reduzida em consequência de quaisquer causas
naturais ou por conveniência de interesse público, o particular
optará pela redução proporcional da taxa a pagar ou pela
renúncia ao seu direito de uso privativo.
2. Se, na segunda das hipóteses previstas no número anterior,
o particular optar pela renúncia à concessão, terá
direito a uma indemnização calculada nos termos do n.º 3
do artigo 28.º
ARTIGO 30.º
(Utilização abusiva)
1. Se for abusivamente
ocupada qualquer parcela dominial, ou nela se executarem indevidamente quaisquer
obras, a entidade competente intimará o contraventor a desocupar o domínio
ou a demolir as obras feitas no prazo que lhe for marcado.
2. Decorrido o prazo fixado sem que a intimação se mostre cumprida,
e sem prejuízo da aplicação das penas que no caso couberem
ou da efectivação da responsabilidade civil do contraventor pelos
danos que causar, a entidade competente assegurará o destino normal da
parcela ocupada, designadamente pelo recurso à força pública,
ou mandará demolir as obras por conta do contraventor, sendo as despesas
cobradas pelo processo de execução fiscal, servindo de título
executivo certidão passada pela entidade competente para ordenar a demolição,
extraída de livros ou documentos donde conste a importância da
despesa e com os demais requisitos exigidos no artigo 156.º do Código
de Processo das Contribuições e Impostos.
3. Se, porém, o interessado sustentar que o terreno ocupado lhe pertence,
deverá requerer a respectiva delimitação, podendo a entidade
competente autorizar provisòriamente a continuidade da utilização
privativa, nos termos do n.º 3 do artigo 24.º
ARTIGO 31.º
(Defesa dos direitos do utente privativo)
1. Sempre que alguma parcela
dominial se encontrar afectada a um uso privativo e este for perturbado por
ocupação abusiva ou outro meio, pode o titular da respectiva licença
ou concessão requerer à entidade competente que tome as providências
referidas no artigo 30.º, ou outras que se revelem mais eficazes, para
garantia dos direitos que lhe pertencem.
2. O Estado e as demais entidades competentes, ou os respectivos órgãos
e agentes, respondem civilmente perante o interessado, nos termos gerais, por
todos os danos que para este advierem da falta, insuficiência ou inoportunidade
das providências adequadas à garantia dos seus direitos.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
IV
Disposições finais e transitórias
ARTIGO 32.º
(Entidades competentes nos arquipélagos da Madeira e dos Açores)
Nas zonas de jurisdição
das administrações portuárias e nos distritos autónomos
dos arquipélagos da Madeira e dos Açores, em que a Direcção-Geral
dos Serviços Hidráulicos não exerça jurisdição,
os poderes que neste diploma lhe são conferidos serão exercidos
pelas entidades que em cada caso aí a substituam.
(Ver nova redacção dada pelo artigo
1.º da Lei n.º 16/2003, de 4 de Junho)
ARTIGO 33.º
(Disposições expressamente revogadas)
Ficam expressamente revogados
o artigo 261.º do Regulamento dos Serviços Hidráulicos, o
artigo 14.º do Decreto n.º 12445, de 29 de Setembro de 1926, o artigo
5.º do Decreto-Lei n.º 23925, de 29 de Maio de 1934, e o artigo 1.º
do Decreto-Lei n.º 49215, de 30 de Agosto de 1969.
ARTIGO 34.º
(Entrada em vigor)
O presente diploma entra em vigor noventa dias após a sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho
de Ministros. - Marcello Caetano - Mário Júlio Brito de Almeida
Costa - Manuel Pereira Crespo - Rui Alves da Silva Sanches.
Promulgado em 27 de Outubro de 1971.
Publique-se.
O Presidente da República, AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ.